Eu tinha um sonho muito grande com o parto antes de ter filhos, tinha todo um esquema na cabeça de como ia ser e o que era ou não necessário em determinada circunstâncias. Minha escolha de médico (assim como muita coisa mais tarde) foi seguindo os passos da minha mãe. Sabendo dos relatos dela, imaginei que ele ia priorizar o parto a cirugia.
Ledo engano, infelizmente.
As dores começaram por volta das 5h, eu avisei meu marido, estávamos dormindo na casa da minha mãe, para caso o trabalho de parto começasse. Ele saiu para trabalhar, e as dores foram aumentando. Ligamos para o médico, que orientou que passasse no consultório. Eu, com a calma e força que sempre tive para dor, sorri ao ver ele, que riu, e disse que não estava com jeito de quem ia ganhar naquele dia. O exame mostrou 3cm de dilatação, e ele mandou ir ao hospital depois do almoço, e que eu não deveria comer.
A começar pelos procedimentos desnecessários, tudo me incomodou. Limpeza, sorinho, depilação, posição deitada por nove horas, o forceps me olhando na sala todo o tempo.
Eu pouco sabia sobre parto, além dos relatos maternos. Não fazia ideia que 99% do que aconteceu ali era procedimento desnecessário e até mesmo proibido. Fiquei com a minha (cega) confiança nos médicos.
De tempos em tempos, alguma enfermeira aparecia para fazer o toque. A dilatação tava bem no início, ainda não tava sequer perto de algo acontecer. Quando o médico chegou as 18h, rompeu a bolsa (também desnecessariamente), e a dilatação ainda estava em 6cm. Foi então que ele começou a me orientar para fazer força (que eu não fazia ideia de como), fora do tempo certo para isso... Eu não sabia disso, claro. Fiquei um pouco menos de duas horas tentando fazer força, até que não aguentei o cansaço e cochilava entre as contrações (que seguiam de 3 em 3, acredito eu). Ele disse que não dormisse, me xingou, começou a dizer que não tinha condições de ter um parto normal, que ia matar meu filho, fazer um terror psicológico em mim e meu marido, que só tinha 19 anos, e estava bem nervoso. Ele dizia que eu ia acabar pedindo a cesárea, que estava perdendo um churrasco por minha causa (em tom de brincadeira, mas ainda assim, isso me atingia).
Eu me sentia exausta. A dor não me incomodava, eu aguentaria até o final, se fosse preciso. Mas o cansaço e o sono tomavam conta, e eu comecei a ter pensamentos de que não conseguiria ter meu filho, de que ele podia morrer, e talvez fosse por bem fazer a cirugia. Meu marido veio conversar comigo e me fez ver que não dava mais para esperar (apesar de eu discordar disso hoje). Sem forças, disse que não aguentava mais, e aceitei a cesárea. Esperei ainda uns 40min até liberarem a sala, período em que fiquei torcendo para que passasse logo, para a anestesia chegar e aquela dor passar (lembrando que foram quase 18h de trabalho de parto). Colocaram a sonda para a cirugia e as 22:30h, eu estava na sala de cirugia tomando a peridural na coluna (que pra quem não sabe, dói bastante, mas estava com dor a tanto tempo que até a dor da anestesia foi um alívio). Senti minha barriga sendo aberta e as enfermeiras empurrando o bebê, que estava preso na área das costelas e por isso levou tanto tempo para descer. As 22:40h do dia 1 de setembro de 2015, ouvi o choro estridente de um bebê que era meu. Meu pensamento foi "caramba, eu tenho um filho". A ficha caiu naquele momento, percebi que nunca tinha pensado com seriedade no fato que um bebê estaria sob minha responsabilidade agora. Meu segundo pensamento foi que era a mesma cara que meu marido (rsrs). Gabriel nasceu com 4.100kg e 51cm.
Quis muito conversar com alguém sobre minha frustração no pós parto, mas ninguém me deu abertura, todos queriam que eu ficasse feliz com o bebê e só. Ninguém queria ouvir o drama de uma mãe recém nascida que teve todos os seus sonhos quebrados. Tive depressão pós parto por longos 19 meses, em que meu filho recebeu todos os cuidados (com muita ajuda), mas não toda atenção e paciência que precisava quando bebê. Felizmente tudo passou, e só então, tive a consciência que eu só saíria bem daquilo se falasse no assunto. Quando percebesse que foi assim e não dava para mudar.
A minha segunda gravidez, apesar de planejada, veio com choro e medo. Eu sentia medo de outro parto frustrado, e medo de o trauma me impedir de conseguir. Tive depressão gestacional pelo mesmo motivo. O parto da minha filha me libertou do trauma, ao invés disso. Percebi no parto dela, que tudo aquilo foi desnecessário, sim, que eu era muito capaz de parir, e que ainda não estava no período expulsivo do parto. E o melhor de tudo, eu percebi que o parto normal naquele dia, teria me frustrado muito mais, porque teria sido totalmente diferente do que eu queria, além de que teria terminado com uma episotomia (tinha mais medo disso que da cesárea kk).
Hoje sou liberta do trauma desse dia, e muito feliz com o filho que aquela cirugia me deu. Jamais culpei ele pelo que aconteceu (apesar de por um bom tempo ter culpado meu marido rsrs), mas o médico nunca vou deixar de culpar (já ouvi muito médico dizer que ele tava pensando em mim e no bebê, eu duvido).
Vai sair os outros dois relatos de parto, sim, mas provavelmente vai demorar bastante kk