Receber o diagnóstico de autismo na fase adulta foi como finalmente encontrar uma legenda para um filme que eu assistia a vida toda sem entender direito. De repente, comportamentos, dificuldades e sensações que antes pareciam falhas pessoais passaram a ter um nome — e um motivo.
Uma das coisas mais difíceis de encarar foi perceber como tantas áreas da minha vida estavam atravessadas por essa diferença neurológica. A começar pelas coisas mais básicas: limpeza da casa, higiene pessoal, organização do cotidiano. Para muita gente, essas são tarefas simples, quase automáticas. Para mim, sempre foram um mistério.
Nunca fui ensinada de verdade como cuidar da minha higiene ou manter uma casa em ordem. Apenas esperavam que eu "soubesse". Mas meu cérebro não funciona assim. Sem modelos claros, instruções passo a passo ou apoio prático, essas tarefas viraram fontes constantes de frustração, culpa e, muitas vezes, vergonha.
Outra grande dificuldade é no campo das interações sociais. Normas de educação, aquelas regrinhas implícitas de convivência, sempre me pareceram enigmáticas. Às vezes falo "fora de hora", não reajo do jeito esperado, ou deixo de perceber sinais que para os outros são óbvios. Já fui considerada "fria", "estranha", "grossa", quando na verdade eu estava apenas tentando entender como agir, tentando me encaixar em códigos que nunca me foram decifrados.
O diagnóstico não resolveu tudo — mas trouxe alívio. Ele me deu um ponto de partida. Me ajudou a compreender que eu não sou preguiçosa, mal-educada ou desligada. Eu sou autista. E isso muda tudo na forma como encaro a mim mesma.
Hoje, ainda estou aprendendo. Estou me ensinando o que ninguém me ensinou. Estou criando estratégias, pedindo ajuda sem tanto medo, aceitando limites e celebrando pequenas vitórias.
Acima de tudo, estou me permitindo existir do meu jeito — com mais compaixão.
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